domingo, 20 de julho de 2008
Governo quer agenda quilombola e luz elétrica para Marambaia, diz ministro
Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Repórter Vladimir Platonow
Ilha da Marambaia (RJ) - Líder comunitária Vânia Guerra defende demarcação de comunidade remanescente de quilombo
Ilha da Marambaia (RJ) - Líder comunitária Vânia Guerra defende demarcação de comunidade remanescente de quilombo
Rio de Janeiro - Os moradores da Ilha da Marambaia, na Baía de Sepetiba, em Mangaratiba (RJ), poderão contar, em breve, com fornecimento de eletricidade. Descendentes de escravos, as famílias ainda hoje usam lampião e dependem da energia fornecida em parte da ilha por um gerador a óleo da Marinha, que administra o local e não os reconhece como quilombolas.
A informação sobre a chegada da energia elétrica foi dada pelo ministro da Secretaria Especial para a Promoção de Políticas de Igualdades Raciais (Seppir), Edson Santos, depois de uma reunião realizada na última segunda-feira (14) com lideranças quilombolas da Marambaia, Ministério Público Federal (MPF), Instituto de Colonização e Reforma Agrária (Incra) e Advocacia-Geral da União (AGU), em Brasília.
“Nós vamos definir uma agenda social quilombola junto com a comunidade, incluindo educação, saneamento básico, energia elétrica e geração de renda”, disse o ministro.
Com 8,1 mil hectares, a ilha está no centro de uma disputa entre a Marinha, que tem ali o Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia (Cadim), local de treinamento dos Fuzileiros Navais, e parte dos moradores, que se intitulam descendentes quilombolas e reivindicam 1,6 mil hectares.
A disputa começou em 2004 com o reconhecimento da região como remanescente de quilombo, segundo documento da Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura, e hoje se encontra em análise pela AGU, que formou uma comissão para estudar o assunto.
Para o ministro, a questão deve ser tratada democraticamente, buscando a convergência. “Não haverá nenhuma decisão de força do governo. Temos condições de compatibilizar os interesses estratégicos da Marinha e os da comunidade que são legítimos e tem história no local”, defendeu.
O subsecretário de Políticas para Comunidades Tradicionais da Seppir, Alexandro Reis, não tem dúvida de que a comunidade da Marambaia descende de um quilombo e considera que a chegada da luz elétrica tem um significado emblemático para o seu reconhecimento. “Nós vamos trabalhar com o Ministério de Minas e Energia e buscar diálogo com a Marinha para que o programa Luz para Todos chegue à comunidade de forma mais célere”, disse Reis.
Segundo ele, as outras demandas da agenda social quilombola, referentes à educação, geração de renda e ao saneamento serão encaminhadas, ainda este ano, para os ministérios de cada área.
Para a líder comunitária Vânia Guerra, a reunião foi positiva, principalmente com relação à possibilidade de trazer a eletricidade para os moradores. “É claro que isso vai acarretar em melhorias. Atualmente, o gerador da Marinha atende só a área do quartel.”
Por causa da falta de eletricidade, confortos simples da vida moderna, na Marambaia, ainda são raridades. “A situação é bem precária. As poucas pessoas que têm condições, usam geladeira a gás ou compram um gerador. Para assistir televisão, só usando bateria de carro”, conta Vânia, que precisa andar cerca de um quilômetro, até o quartel da Marinha, para carregar o telefone celular.
Segundo ela, a chegada da luz vai ser uma revolução na ilha, criando novas oportunidades econômicas e beneficiando diretamente a comunidade de pescadores que poderá conservar mais facilmente e por mais tempo o pescado.
Atualmente, segundo a Seppir, há 1,2 mil comunidades reconhecidas como quilombolas pela Fundação Palmares no país, com 600 processos de demarcação em análise pelo Incra.
Ministro defende titulação coletiva de área ocupada por quilombolas no Rio
Brasília - Ministro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Edson Santos, defende titulação coletiva de área ocupada por quilombolas na Ilha de Marambaia
Isabela Vieira
Repórter da Agência Brasil
Roosewelt Pinheiro/Abr
Rio de Janeiro - O ministro da Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir), Edson Santos, disse que a comunidade remanescente de quilombo da Ilha de Marambaia, no litoral sul fluminense, terá o seu território demarcado. O título, segundo ele, sairá em nome de toda a comunidade e não apenas das famílias.
"Vai sair [a titulação], vai sair”, disse o ministro Edson Santos à Agência Brasil esta semana, ao participar de evento sobre o Mercosul no Rio de Janeiro. "Acho que a titulação será coletiva, não há nada que indique o contrário".
A declaração de Santos contraria o temor da comunidade de que a demarcação, a cargo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), fosse feita em ilhas, abrangendo apenas o terreno da casa dos moradores, muitas de pau-a-pique e sem luz elétrica, deixando de fora áreas comuns.
No início de abril, logo após visita do ministro à ilha, a comunidade divulgou nota criticando a posição dele em relação ao assunto. Pelo documento, Santos teria dito “ser impossível” a posse coletiva da área, o equivalente a um quinto da ilha.
O ministro, no entanto, disse que foi mal-interpretado e defendeu uma demarcação que dê condições de as famílias crescerem e manterem atividades de geração de renda. Enquanto a titulação – parada por determinação da Justiça – não é finalizada, ele promete melhorias no local.
“A Seppir vai coordenar a implementação de serviços de saúde, educação, fornecimento de energia elétrica, ao passo em que vamos fazer entendimentos sobre a delimitação da área da comunidade quilombola.”
A demarcação de Marambaia está parada por conta de divergências judiciais. Na última decisão, a Justiça Federal suspendeu o processo no Incra acatando pedido da União. No caso, o desembargador Sergio Feltrin alegou que os quilombolas poderiam colocar em risco as atividades militares na ilha e o meio ambiente.
Os moradores de Marambaia disputam com a Marinha a demarcação de seu território, que já foi reconhecido pela Fundação Cultural Palmares. Os militares mantêm um centro de treinamento na ilha e defendem o local como estratégico para atividades navais.
Sem consenso, o impasse foi parar na Advocacia-Geral da União (AGU), que ainda não se pronunciou sobre o caso. O procurador responsável pelo processo, Daniel Levy, não foi encontrado para dar declarações.
Moradores de Marambaia defendem permanência da Marinha
Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O debate sobre a demarcação de uma área quilombola na ilha da Marambaia expõe a delicada relação da Marinha e dos moradores, a maioria descendente de escravos.
Embora lideranças comunitárias defendam o reconhecimento de parte da ilha como quilombo, boa parte dos moradores reconhece o trabalho dos militares e defendem sua presença.
Distante cerca de uma hora do continente, a comunidade depende do transporte gratuito oferecido em um barco da Marinha, que também oferece serviço de saúde e fornece luz elétrica através de um gerador a óleo para parte da ilha, incluindo a escola.
No posto de saúde a consulta é de graça e praticamente não há filas. Para a aposentada Lúcia Alves Soares, 68 anos, o serviço é essencial: “Se a gente tem uma dor, é aqui que a gente se socorre”. Ela diz que nasceu na ilha, assim como seus pais e avós, e lembra que, ainda criança, ouvia falar na existência de um quilombo: “Os meus pais falavam que tinha”.
Ramiro Benedito Santos, de 77 anos, defende a permanência da Marinha na região: “Desde que a Marinha chegou aqui, melhorou muito. Se ela saísse, tudo ia piorar”. Nascido em Marambaia, o pescador aposentado conta que seus avós eram escravos, naturais da própria ilha. Porém, ele diz não se lembrar de ter ouvido falar sobre a existência de quilombos na região.
A falta de memória sobre a existência de um quilombo no lugar também é um problema para Ignes Rosa, de 92 anos, que conta ter sido cozinheira do ex-presidente Getúlio Vargas por duas vezes. Ela lembra que o avô nasceu na ilha, mas que a avó veio da África.
Já os jovens da ilha destacam o desafio de achar trabalho e educação mais qualificados. Aos 20 anos de idade, cursando o primeiro ano do ensino médio, Rafael Guerra Saturnino, filho da líder comunitária Vânia Guerra, sonha em terminar a escola e fazer faculdade. Até este ano, a única escola da ilha só oferecia até o nível fundamental, mas agora passou a contar com um supletivo noturno de nível médio.
"Aqui não tem muita opção, além da pescaria. Além disso, todo mundo tem de morar agarrado. Se eu casar, tenho de fazer um puxado na casa da minha mãe, igual fez a minha irmã. Se saísse a titulação, ia ser bem melhor. É difícil, mas a gente vai lutando devagarzinho”, diz ele, referindo-se à proibição imposta pela Marinha de que sejam erguidas novas casas no local.
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O debate sobre a demarcação de uma área quilombola na ilha da Marambaia expõe a delicada relação da Marinha e dos moradores, a maioria descendente de escravos.
Embora lideranças comunitárias defendam o reconhecimento de parte da ilha como quilombo, boa parte dos moradores reconhece o trabalho dos militares e defendem sua presença.
Distante cerca de uma hora do continente, a comunidade depende do transporte gratuito oferecido em um barco da Marinha, que também oferece serviço de saúde e fornece luz elétrica através de um gerador a óleo para parte da ilha, incluindo a escola.
No posto de saúde a consulta é de graça e praticamente não há filas. Para a aposentada Lúcia Alves Soares, 68 anos, o serviço é essencial: “Se a gente tem uma dor, é aqui que a gente se socorre”. Ela diz que nasceu na ilha, assim como seus pais e avós, e lembra que, ainda criança, ouvia falar na existência de um quilombo: “Os meus pais falavam que tinha”.
Ramiro Benedito Santos, de 77 anos, defende a permanência da Marinha na região: “Desde que a Marinha chegou aqui, melhorou muito. Se ela saísse, tudo ia piorar”. Nascido em Marambaia, o pescador aposentado conta que seus avós eram escravos, naturais da própria ilha. Porém, ele diz não se lembrar de ter ouvido falar sobre a existência de quilombos na região.
A falta de memória sobre a existência de um quilombo no lugar também é um problema para Ignes Rosa, de 92 anos, que conta ter sido cozinheira do ex-presidente Getúlio Vargas por duas vezes. Ela lembra que o avô nasceu na ilha, mas que a avó veio da África.
Já os jovens da ilha destacam o desafio de achar trabalho e educação mais qualificados. Aos 20 anos de idade, cursando o primeiro ano do ensino médio, Rafael Guerra Saturnino, filho da líder comunitária Vânia Guerra, sonha em terminar a escola e fazer faculdade. Até este ano, a única escola da ilha só oferecia até o nível fundamental, mas agora passou a contar com um supletivo noturno de nível médio.
"Aqui não tem muita opção, além da pescaria. Além disso, todo mundo tem de morar agarrado. Se eu casar, tenho de fazer um puxado na casa da minha mãe, igual fez a minha irmã. Se saísse a titulação, ia ser bem melhor. É difícil, mas a gente vai lutando devagarzinho”, diz ele, referindo-se à proibição imposta pela Marinha de que sejam erguidas novas casas no local.
Marinha diz que área ocupada por quilombolas é estratégica
Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O caráter estratégico é o motivo defendido pela Marinha para não ceder aproximadamente um quinto da Ilha da Marambaia aos quilombolas. Localizada na Baía de Sepetiba, área que abriga os principais projetos econômicos do estado, como Porto de Sepetiba e Companhia Siderúrgica do Atlântico, a ilha também está próxima das usinas nucleares de Angra dos Reis.
No local há, inclusive, a possibilidade de que se construa uma futura base de submarinos nucleares. De acordo com o Comandante-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, almirante de esquadra Álvaro Augusto Dias Monteiro, as novas gerações de submarinos – nucleares ou convencionais – são consideradas decisivas para a segurança nacional e já não podem mais ficar fundeadas na antiga base da Ilha do Mocanguê, próximo à Ponte Rio-Niterói, na Baía de Guanabara.
“Desde que isso [submarino nuclear] seja confirmado como projeto do estado brasileiro, a Baía de Sepetiba é um dos locais adequados à instalação de uma base de submarinos, nucleares ou mesmo convencionais de maior porte. A nossa base atual é dentro da Baía de Guanabara e futuramente pode não ser mais conveniente a permanência de todos esses barcos ali. Para nós, Marambaia é de uma estratégia fundamental”, explicou o militar.
Entre os motivos que tornam a base do Mocanguê obsoleta está a dificuldade de movimentação e saída rápida da Baía de Guanabara, que possui um tráfego intenso de embarcações, além da profundidade menor, tornando um submarino mais vulnerável em caso de ataque.
Segundo o almirante, Sepetiba tem um canal natural com 50 metros de profundidade, o que facilita submersão e movimentação imediata para alto-mar. “Marambaia domina a entrada desse canal, então é preciso preservá-la para que ela possa cumprir esse papel”, destacou Monteiro.
Para ele, se não forem tomados cuidados, a ilha pode atrair um grande número de novos moradores e sofrer um rápido processo de favelização.
“No caso da Ilha Grande e Angra dos Reis, a pressão demográfica foi muito grande e o Poder Público não foi competente para impedir a degradação. Na Marambaia, o ambiente está preservado, tanto pela Marinha quanto pelos moradores. Temo que, se isso for titulado de maneira imprecisa, a comunidade não tenha poder político suficiente para impedir a explosão demográfica”, alertou o militar.
A líder comunitária Vânia Guerra afirma que a demarcação da área como quilombo em nada atrapalharia os planos da Marinha em construir na região uma base de submarinos. “Nós sempre vivemos ali, mesmo antes da Marinha chegar e nunca atrapalhamos em nada.”
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O caráter estratégico é o motivo defendido pela Marinha para não ceder aproximadamente um quinto da Ilha da Marambaia aos quilombolas. Localizada na Baía de Sepetiba, área que abriga os principais projetos econômicos do estado, como Porto de Sepetiba e Companhia Siderúrgica do Atlântico, a ilha também está próxima das usinas nucleares de Angra dos Reis.
No local há, inclusive, a possibilidade de que se construa uma futura base de submarinos nucleares. De acordo com o Comandante-Geral do Corpo de Fuzileiros Navais, almirante de esquadra Álvaro Augusto Dias Monteiro, as novas gerações de submarinos – nucleares ou convencionais – são consideradas decisivas para a segurança nacional e já não podem mais ficar fundeadas na antiga base da Ilha do Mocanguê, próximo à Ponte Rio-Niterói, na Baía de Guanabara.
“Desde que isso [submarino nuclear] seja confirmado como projeto do estado brasileiro, a Baía de Sepetiba é um dos locais adequados à instalação de uma base de submarinos, nucleares ou mesmo convencionais de maior porte. A nossa base atual é dentro da Baía de Guanabara e futuramente pode não ser mais conveniente a permanência de todos esses barcos ali. Para nós, Marambaia é de uma estratégia fundamental”, explicou o militar.
Entre os motivos que tornam a base do Mocanguê obsoleta está a dificuldade de movimentação e saída rápida da Baía de Guanabara, que possui um tráfego intenso de embarcações, além da profundidade menor, tornando um submarino mais vulnerável em caso de ataque.
Segundo o almirante, Sepetiba tem um canal natural com 50 metros de profundidade, o que facilita submersão e movimentação imediata para alto-mar. “Marambaia domina a entrada desse canal, então é preciso preservá-la para que ela possa cumprir esse papel”, destacou Monteiro.
Para ele, se não forem tomados cuidados, a ilha pode atrair um grande número de novos moradores e sofrer um rápido processo de favelização.
“No caso da Ilha Grande e Angra dos Reis, a pressão demográfica foi muito grande e o Poder Público não foi competente para impedir a degradação. Na Marambaia, o ambiente está preservado, tanto pela Marinha quanto pelos moradores. Temo que, se isso for titulado de maneira imprecisa, a comunidade não tenha poder político suficiente para impedir a explosão demográfica”, alertou o militar.
A líder comunitária Vânia Guerra afirma que a demarcação da área como quilombo em nada atrapalharia os planos da Marinha em construir na região uma base de submarinos. “Nós sempre vivemos ali, mesmo antes da Marinha chegar e nunca atrapalhamos em nada.”
Questão quilombola de Marambaia já leva 150 anos
Vladimir Platonow
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O reconhecimento da Ilha da Marambaia como comunidade quilombola esbarra em um emaranhado de versões históricas, leis, decretos e instâncias jurídicas. De um lado, a Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura, lideranças comunitárias, organizações não-governamentais, um juiz federal e um procurador federal. Do outro está a Marinha e a Procuradoria Regional da União. No meio ainda há o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a Advocacia Geral da União (AGU) e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo documentos aceitos pela Marinha, para se entender a disputa jurídica é preciso voltar ao ano de 1856, quando a ilha foi registrada em nome do Comendador Breves, que, ao falecer em 1889, deixou o terreno para a esposa. Pouco tempo depois, ela teria vendido a área para a Companhia Promotora de Indústrias e Melhoramentos, que faliu em 1896 e teve a propriedade da Marambaia transferida para o Banco do Brasil.
De posse do imóvel, a União disponibilizou o uso para a Marinha, que ali instalou a Escola de Aprendizes-Marinheiros, em 1908. Em 1943, uma parte da ilha foi cedida para a instalação da Escola de Pesca Darcy Vargas e, em 1971, foi novamente reintegrada ao patrimônio da União e à Marinha, que em 1981 criou o Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia (Cadim), para treinamento dos Fuzileiros Navais.
Já de acordo com as lideranças quilombolas a história é diferente. Segundo artigo da revista Existimos, publicada pela Associação dos Remanescentes de Quilombos da Ilha da Marambaia (Arquimar), com apoio de organizações não-governamentais, o Comendador Breves, ao fim da escravidão, em 1888, distribuiu as praias entre as famílias dos negros que trabalhavam em sua fazenda, embora desse gesto não haja qualquer documento.
Para a líder comunitária Vânia Guerra, a não existência de documentos em nada invalida a posse da terra pelos descendentes de escravos. “Isso é uma coisa que a gente não tem dúvida. Todos sabem que a história do negro não consta em documentos, ela é passada oralmente. Quem mora na região sabe que a Marambaia era um reduto negro, para onde eles eram traficados e passavam por um período de engorda, a fim de ficarem saudáveis e depois serem vendidos”, disse.
Recentemente, a questão foi judicializada e os quilombolas tiveram duas vitórias importantes: o reconhecimento pela Fundação Cultural Palmares, em 2004, e uma sentença favorável expedida pelo juiz federal Raffaele Felice Pirro, de Angra dos Reis (RJ), em março de 2007.
Porém, em agosto de 2007, uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) do Rio de Janeiro suspendeu parcialmente os efeitos da sentença.
Um ano antes disso, em agosto de 2006, o Incra chegou a publicar no Diário Oficial da União o reconhecimento e a delimitação do quilombo da Marambaia, mas voltou atrás no dia seguinte, emitindo uma nova portaria tornando a anterior sem efeito.
Atualmente, o assunto está sendo analisado pela AGU, através de um grupo de trabalho.
Para o Procurador Regional da República Daniel Sarmento, a questão não chega a uma solução por interferência da Marinha. “Está havendo uma séria violação dos direitos fundamentais dos quilombolas em função da pressão política da Marinha”. Segundo ele, o que está valendo hoje é uma liminar que assegura aos quilombolas o direito de continuarem na ilha.
A situação já chegou inclusive ao STF, através da argüição de inconstitucionalidade do Decreto 4.887, de 2003, que define o conceito de quilombo, a fim de poder ser aplicado o que prevê a Constituição federal: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) foi interposta pelo extinto PFL, atual DEM, em junho de 2004, atacando a ilegitimidade do poder Executivo em editar o decreto, que teria de passar pelo Legislativo, e também a validade do conceito de auto-determinação dos quilombolas. A relatoria é do ministro Cezar Peluso e ainda não há data para julgamento.
Repórter da Agência Brasil
Rio de Janeiro - O reconhecimento da Ilha da Marambaia como comunidade quilombola esbarra em um emaranhado de versões históricas, leis, decretos e instâncias jurídicas. De um lado, a Fundação Cultural Palmares, ligada ao Ministério da Cultura, lideranças comunitárias, organizações não-governamentais, um juiz federal e um procurador federal. Do outro está a Marinha e a Procuradoria Regional da União. No meio ainda há o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), a Advocacia Geral da União (AGU) e o Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo documentos aceitos pela Marinha, para se entender a disputa jurídica é preciso voltar ao ano de 1856, quando a ilha foi registrada em nome do Comendador Breves, que, ao falecer em 1889, deixou o terreno para a esposa. Pouco tempo depois, ela teria vendido a área para a Companhia Promotora de Indústrias e Melhoramentos, que faliu em 1896 e teve a propriedade da Marambaia transferida para o Banco do Brasil.
De posse do imóvel, a União disponibilizou o uso para a Marinha, que ali instalou a Escola de Aprendizes-Marinheiros, em 1908. Em 1943, uma parte da ilha foi cedida para a instalação da Escola de Pesca Darcy Vargas e, em 1971, foi novamente reintegrada ao patrimônio da União e à Marinha, que em 1981 criou o Centro de Adestramento da Ilha da Marambaia (Cadim), para treinamento dos Fuzileiros Navais.
Já de acordo com as lideranças quilombolas a história é diferente. Segundo artigo da revista Existimos, publicada pela Associação dos Remanescentes de Quilombos da Ilha da Marambaia (Arquimar), com apoio de organizações não-governamentais, o Comendador Breves, ao fim da escravidão, em 1888, distribuiu as praias entre as famílias dos negros que trabalhavam em sua fazenda, embora desse gesto não haja qualquer documento.
Para a líder comunitária Vânia Guerra, a não existência de documentos em nada invalida a posse da terra pelos descendentes de escravos. “Isso é uma coisa que a gente não tem dúvida. Todos sabem que a história do negro não consta em documentos, ela é passada oralmente. Quem mora na região sabe que a Marambaia era um reduto negro, para onde eles eram traficados e passavam por um período de engorda, a fim de ficarem saudáveis e depois serem vendidos”, disse.
Recentemente, a questão foi judicializada e os quilombolas tiveram duas vitórias importantes: o reconhecimento pela Fundação Cultural Palmares, em 2004, e uma sentença favorável expedida pelo juiz federal Raffaele Felice Pirro, de Angra dos Reis (RJ), em março de 2007.
Porém, em agosto de 2007, uma decisão do Tribunal Regional Federal (TRF) do Rio de Janeiro suspendeu parcialmente os efeitos da sentença.
Um ano antes disso, em agosto de 2006, o Incra chegou a publicar no Diário Oficial da União o reconhecimento e a delimitação do quilombo da Marambaia, mas voltou atrás no dia seguinte, emitindo uma nova portaria tornando a anterior sem efeito.
Atualmente, o assunto está sendo analisado pela AGU, através de um grupo de trabalho.
Para o Procurador Regional da República Daniel Sarmento, a questão não chega a uma solução por interferência da Marinha. “Está havendo uma séria violação dos direitos fundamentais dos quilombolas em função da pressão política da Marinha”. Segundo ele, o que está valendo hoje é uma liminar que assegura aos quilombolas o direito de continuarem na ilha.
A situação já chegou inclusive ao STF, através da argüição de inconstitucionalidade do Decreto 4.887, de 2003, que define o conceito de quilombo, a fim de poder ser aplicado o que prevê a Constituição federal: “Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”.
A Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) foi interposta pelo extinto PFL, atual DEM, em junho de 2004, atacando a ilegitimidade do poder Executivo em editar o decreto, que teria de passar pelo Legislativo, e também a validade do conceito de auto-determinação dos quilombolas. A relatoria é do ministro Cezar Peluso e ainda não há data para julgamento.
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